Em sua conferência de 1990 na Universidade de Toronto, intitulada Biologia como Ideologia, Richard Lewontin teceu interessantes observações sobre como a ciência ocupou, em uma sociedade mais secular e racionalista, um papel que antes era exclusivo da Igreja: o de prover justificativas para a consciência popular acerca dos fenômenos sociais. Para este geneticista, vencedor do prêmio Crafoord1 em 2015, a ciência como as demais atividades produtivas é “uma instituição social completamente integrada e influenciada pelas estruturas das demais instituições sociais” (LEWONTIN, 2000). Os problemas que ela lida, as ferramentas das quais ela dispõe, e até os resultados obtidos são fortemente influenciados pelas predisposições que advêm da sociedade na qual vivemos. A produção científica é uma atividade produtiva que consome tempo e dinheiro, então é natural que ela seja dirigida pelas forças que detêm o controle sobre o tempo e o dinheiro. Ela usa mercadorias e é parte do processo de produção de mercadorias. O capitalismo não só necessita dos efeitos econômicos da produção científica, mas ele se apropria ativamente das ideias científicas que lhe convém para sustentar as estruturas sociais que garantem sua dominação. Esse é um processo de mão dupla: o controle do capital sobre os cientistas e também o uso das ideias científicas pelo capital que justificam sua visão de ciência como ideologia (LEWONTIN, 1991).
Veremos nesse subcapítulo exemplos de duas formas diferentes através das quais essa ideologia silencia as vozes dissidentes e se perpetua: as fraudes abertas e os enviesamentos que se tornam quase invisíveis por serem compartilhados por toda uma comunidade de cientistas.
1Prêmio outorgado pela Academia Real de Ciências da Suécia nos campos não cobertos pelo Nobel
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